Nos preparávamos para o casamento da Laís, e todos os momentos eram intensos pois há pouco tempo a gente havia passado pela experiência do casamento do Lucas e da Leti e agora iríamos ter mais essa graça.
Nossa família estava muito feliz de Deus proporcionar estes momentos para nossos dois filhos. Mas já algum tempo o Lucas me falava sobre eu me acostumar a não ter ele por perto, pois iria casar, assumir responsabilidades novas, dividir-se entre as duas famílias, trabalho, faculdade, amigos e os serviços na Igreja. Então nos veríamos com menos frequência, era necessário eu entender ausência dele nas minhas decisões. Já que tudo o que fazíamos era dividido em família. Eu entendi, que era necessário que eu aprendesse a viver com a distância dele e da Laís, respeitar isso com amor.
Na sexta-feira, dia 30/11/18, eu e as madrinhas fizemos um piquenique surpresa de despedida de solteira para Laís no pátio do condomínio, enquanto os meninos se reuniram no salão do condomínio com o noivo André. Mais tarde nós nos juntamos com eles no salão. Enquanto me aproximava do salão, vi ao longe um jovem de costas, e mesmo quando este jovem olhou para mim, eu não reconheci nos primeiros segundos, e era meu filho o Lucas. Me senti envergonhada, silenciei, e o beijei. Ele tinha manchas no rosto, no braço e na barriga iguais a hematomas. Só olhei para ele, e ele entendeu minha preocupação.
Dia 01/12/18 no sábado, foi a nossa primeira visita ao apartamento do Lucas depois de casados. Foi muito bom, foi nossa despedida. Pedi explicações sobre os hematomas, disse que iria no médico dia 03/12/18. No domingo dia 02/12/18 estava tão cansado que não conseguiu caminhar até a Igreja para participar da missa. Segunda-feira foi fazer exames de sangue, e na terça-feira dia 04/12/18, de manhã ele refez o exame, e de tarde foi chamado com urgência para o resultado, e foi levado às pressas para o Hospital Geral. Cheguei perto das 18h, logo que eu soube que ele estava lá. Chegou com os exames do ambulatório na mão, já fizeram a sua baixa, ele foi encaminhado para fazer uma tomografia e exames de sangue, mas estava com aquela expressão amável no rosto. Talvez ele já tivesse percebido que algo estava acontecendo, pois do caminho do ambulatório para o Hospital geral ele tentou persuadir o colega de trabalho que estava dirigindo a deixar pra ir no hospital depois do casamento da Laís, dia 08/12/18, mas o colega não aceitou.
De certa forma, sempre vi em meu filho algo especial, algo diferente, um jovem que diante das dificuldades não sucumbia, nem com a dor, mas tentava entender as coisas que estavam acontecendo; buscava ajudar quem estava ao seu redor, pois acreditava sempre que o outro sofria mais do que ele. Por volta de 1h30min da manhã do dia 05/12/18, quarta-feira, estávamos em casa e a Leti nos chamou para conversarmos no hospital, e disse que era leucemia. Eu e Juarez ficamos atônitos. Não conseguimos chorar. Levamos um choque. Conversamos com ela um pouco, nos abraçamos, ela ficou com ele, eu e Juarez fomos pra casa. O Lucas me pediu que eu levasse pra ele o livro: 25 minutos de Chiara Lucce Badano, e uma Bíblia. Voltei para ficar com ele às 7h20, e passar o dia. A primeira coisa que ele me disse foi para falar com o Padre Alex, pois queria conversar com um Padre. Liguei pra o Padre Alex às 7h29min, e às 8h24min Padre Diego chegou no Hospital. No intervalo de tempo que eu cheguei, até o Padre Diego chegar, eu olhei para o meu filho e senti o que Deus já estava me dizendo a algum tempo atrás. Senti que era momento de despedida, e antes do padre Diego conversar com o Lucas, ele rezou comigo e ali comecei a entender porque eu não tinha esperança de cura; comecei a entender o que Deus estava me falando, porque este jovem tão lindo e tão belo não voltaria mais para casa. Senti tudo isso calada, voltei lá com o Lucas, e ele pediu que queria ficar quieto um pouco meditando, eu senti que era um momento dele com Deus, então tirei uma foto, quis registrar aqueles 25 minutos dele.
Durante a manhã recebi muitas mensagens, pessoas oferecendo todo tipo de ajuda, oferecendo orações. Eu e o Lucas fizemos muitas coisas mas ele sempre querendo ajudar, queria consertar o chuveiro estragado do andar, arrumar a parte elétrica, e me fez ir até uma sala de serviço que ele acreditava que lá tinham ferramentas. Eu fui, mas como não achei nada, disse para ele sossegar pois ele precisava ficar deitado.
Com a situação grave de saúde dele, a Dra. Cíntia disse que deveríamos ir embora e tentar uma hospitalização em Porto Alegre. Expliquei tudo o que a médica havia me dito, conforme orientação dela: vamos sair daqui direto para o Hospital Conceição, não devemos perder tempo. Mas ele me disse: Não mãe, quero ir para casa beijar a Letícia e o Lorenzo depois de lá vamos para Porto Alegre. Senti que a decisão dele era sábia pois tão cedo ele não veria os irmãos menores. Enquanto estávamos em casa, a Dra. me ligou, pediu para voltarmos, pois conseguiu vaga em Porto Alegre para quinta de manhã. Nesta quarta então ele se despediu da Laís, da Letícia, e do Lorenzo. Fiquei com ele até às 20h, quando a Leti veio. Durante este dia pude ver meu amado caridoso, tomando várias atitudes de compaixão com as outras pessoas que estavam internadas.
No dia 06/12/18, na quinta de manhã bem cedo estávamos no hospital para acompanhá-lo, pois ele seria removido para o Hospital Conceição. Já antes de entrar na ambulância os primeiros sintomas se agravaram, desmaio e muita dor de cabeça, recebeu um sedativo, para aguentar a viagem até Porto Alegre. Às 10h46min ele já estava instalado no quarto, porém não recebeu nenhuma medicação pois o sistema estava fora do ar e os enfermeiros aguardavam o TI resolver. Perto de 13h, recebeu as medicações para dor e enjoo, às 15h eu e Juarez conseguimos uma brecha e entramos, o enfermeiro então explicou que seriam 2 anos de tratamento, foi então que ele entendeu e chorou.
Eu e Juarez tivemos que aguardar escondidos em uma sala, pra não nos fazerem sair lá de dentro. Neste tempo ele ficou com a Leti, às 16h no banheiro, vomitou sangue. Depois disso o Juarez ficou com ele, eu e Leti fomos embora, porém ainda estávamos em POA, quando Juarez me ligou e pediu que retornássemos com urgência, foi neste momento dentro do carro quando eu retornei, que esmurrando a direção, eu entendi que não levaria mais Lucas para casa, comecei a me preparar para perdê-lo. Entre 17h e 17h30min, levaram ele correndo nos corredores para fazer tomografia e depois direto para UTI. Quando eu cheguei na UTI, conversei com ele e ele virou o rosto para mim, sorriu, forçando os olhos para abrir, mexendo a cabeça e sinalizando que estava tudo bem. Na minha segunda entrada junto com o médico ajudei a dar os comprimidos contra o avanço da leucemia na boca dele, não abria os olhos. Na terceira vez que eu entrei ele não enxergava mais, o sangramento já havia afetado a visão, virou o rosto lentamente, com um ar de sorriso seguindo a minha voz. Na quarta vez que entrei, não respondeu a nenhum estímulo. Os médicos conversaram conosco e nos explicaram tudo, a gravidade da situação, e se se ele conseguisse sobreviver nas próximas 48h, aí sim, ele teria chance de se recuperar.
Estávamos eu, Juarez, Letícia, Pe Alex. Depois chegaram Laís, André, Jéssica e alguns amigos. Não nos deixaram ficar, nos disseram para irmos embora e voltarmos no outro dia. Saímos de lá quinta-feira em torno de 23h.
As 1h15min de sexta-feira dia 07/12/18, nos chamaram com urgência. Fomos às pressas, eu e Juarez com a Jéssica, e Pe. Alex nos encontrou lá. Chegamos e pude entrar sozinha, me disseram que estavam preparando ele para levar o para o Hospital Cristo Redentor, para cirurgia. Olhei para ele, e vi que estava morto. Fiquei parada por alguns segundos. Mas entendi que eu precisava aguardar o tempo de Deus. Fui na ambulância com ele. Perto das 3h, no Hospital Cristo Redentor, foi lavrado morte cerebral. Voltamos com ele para o Hospital Conceição. O médico entendeu a importância das pessoas entrarem, e autorizou a entrada de todas as pessoas que estavam na sala de espera aos poucos, para se despedirem. Logo que entrei no quarto da UTI olhei para ele, e vi aquele jovem lindo, não senti dor, não senti desespero, e ao mesmo tempo não entendia porque eu estava sentindo isso. Mas comecei a ser tomada por uma calma, por uma paz muito grande, aquele jovem que estava ali, aquele corpo que estava ali, parecia que me explicava o que Deus estava operando. Entendi que era importante que todos os amigos, as pessoas que ele amava, parentes, entrassem na sala para se despedirem, porque eu sentia que as pessoas seriam tomadas por graças. Aquele jovem ali ele se esforçou para imitar os santos, aquele jovem teve as mesmas lutas que seus amigos.
Observei as pessoas que estavam chegando, até que todos os amigos mais íntimos dele estivessem ali, então autorizei médico a desligar as máquinas. Porque Deus dizia dentro do meu coração que era um momento de entender que nossa vida é passageira e tem que ser vivida para alcançarmos o céu, e este jovem que estava ali, meu filho, meu filho amado, tinha se esforçado muito para ir para o céu e havia chegado o seu momento. Rezamos, cantamos, conversamos com ele, lembramos de alguns momentos, unidos em volta daquele anjo. Depois ficamos em profundo silêncio rezando, aguardando a despedida. Como se estivéssemos no Getsêmani.
Pela manhã de quinta, Padre Diego iluminado por Deus já havia meditado com Lucas e comigo sobre Getsêmani. E agora estávamos realizando aquilo que Deus havia suscitado no coração do Padre Diego.
Lucas morreu às 11h10min de 07/12/18.
Eu o Juarez não cuidamos de nada, os amigos providenciaram tudo, a família cuidou da remoção do corpo para São Leopoldo. Na volta de Porto Alegre para Novo Hamburgo eu chorei muito dentro do carro, foi meu momento. Fomos às 18h para a Paróquia Nossa Senhora das Graças na Feitoria em São Leopoldo, onde nossos amigos prepararam o velório, e ali mesmo compraram um túmulo onde ele seria enterrado no outro dia.
Nossos amigos providenciaram tudo eu e meu marido não precisamos fazer nada. O corpo chegou perto das 19h30min. No momento em que chegamos, recebemos os abraços e carinho de muitas pessoas até à 1h de manhã de sábado, de pé, foram quase 3.000 pessoas que estiveram ali para se despedir do Lucas.
Por alguns momentos dando alguns passos no presbitério, sem muito tempo para pensar, porque as pessoas não paravam de chegar, e vinham nos abraçar, eu pensei: “Como posso eu sentir tristeza? como posso me sentir mal? se meu Senhor a quem ensinei meu filho a seguir e amar, veio buscá-lo? Quando vi tantos jovens, tantas pessoas, tantas famílias, entendi que meu filho poderia ser um sinal, poderia ser um testemunho verdadeiro no hoje, de que devemos viver uma vida em busca da santidade. Não tinha vontade de chorar embora algumas pessoas que me abraçavam estavam tão tristes, que eu chorava por elas, não pelo meu filho, pois ele estava no céu. Queria dizer as pessoas que não sofressem tanto, pois meu amado havia ganho o que esperava com ardor, havia encontrado o céu que tanto queria. Estava feliz. Queria poder mostrar ou repassar a paz, o amor, a alegria de Céu que eu estava sentindo.
Deus me mostrava um pouco do Céu que meu filho estava vivendo. Aquele sorriso dele, a alegria de estar com os santos e anjos.
Logo que os jovens do ONDA chegaram, pedi que sentassem perto e começassem a tocar as músicas que o Lucas os havia ensinado, durante toda noite e pela madrugada adentro até a missa de corpo presente os jovens passavam os violões à diante para outros, de outros grupos, mas a música nunca parou. Essa noite era importante pois nosso afilhado Cléber iria se ordenar sacerdote. Ele era muito amigo do Lucas, e no término da Ordenação, muitos padres passaram por lá, e Dom Zeno foi com os seminaristas para se despedir do Lucas e conduziu a oração.
Tive que ir para casa de madrugada, não sei que horas nem como, não lembro, pois estava muito cansada, dois dias sem dormir. Os nossos amigos e alguns parentes permaneceram na Igreja.
Voltamos para Paróquia dia 08/12/18 às 8 horas da manhã. Igreja sempre lotada.
Na missa de corpo presente tinham 3 diáconos e 17 padres, Padre Diego que completava um ano de ordenação, presidiu a missa. A homilia foi lindíssima, foi perfeita, totalmente iluminada pelo Espírito Santo.
Ao final da homilia Padre Diego inspirou todos a cantarmos o glória novamente, senti uma alegria muito forte, tomou conta do meu coração, meu amado estava entrando no céu. Tenho certeza que ali aconteceu verdadeiramente a sua Páscoa. Enquanto saíamos com o corpo e caminhávamos para o cemitério, os sinos tocavam e os jovens do ONDA cantavam o Hino do ONDA. Meu coração estava totalmente agradecido por Deus ter me dado a honra de ter gerado, cuidado, educado e amado este filho Dele, pois agora estávamos o devolvendo para o Pai. Jamais em minha vida, experimentei uma presença tão forte de Deus em meu coração. “Em meio a tanta dor não cesse o louvor em meus lábios e em meu coração.”
Entendi que aquele jovem de tanto amor que havia em seu coração, agora encontrava o céu que buscava. “Minha vida é um brevíssimo segundo.”
Terminado então o enterro era a hora de pensarmos na nossa filha Laís, pois ela havia prometido na quarta-feira para o Lucas que de qualquer forma ela iria casar no sábado.
Não estávamos desrespeitando o falecido, não haveria baile ou outros requintes dos casamentos normais. Mas a Laís cresceu com o Lucas, participaram juntos da Igreja, fizeram formação de noivos juntos, sabiam da importância da Graça Santificante do Sacramento do Matrimônio. Por isso com o coração ainda dilacerado, levamos nossa filha ao altar de noite. E com esse esforço por amor à Cristo, na homilia belíssima do Pe. Alex ele nos explica que minha filha Laís ao contrair o Sacramento do Matrimônio se encontrou no Céu com o Lucas. Laís cantou Viver e morrer enquanto adorávamos o nosso Senhor. Nossa obediência à Deus nos encheu do Espírito Santo. E a todos os presentes.
No domingo de manhã, dia 09/12/18, fomos na 1ª missa do Padre Cléber, e também dia do aniversário de um dos melhores amigos do Lucas, o Caíque. Durante toda a semana recebi muitas mensagens de pessoas que fizeram sua experiência de céu naqueles dias. No sábado dia 15/12/18, a missa de sétimo dia. Na Paróquia Nossa Senhora Medianeira. Onde o Lucas foi batizado e onde participava como tio do ONDA, onde recebeu o sacramento inicial da vida cristã, e teve sua última participação na vida pastoral . A Igreja estava lotada, pessoas no fundo de pé. Mais de 30 violeiros representando o ONDA e o EJU, uma homenagem inesquecível.
Depois teve a missa de um mês na Paróquia Santa Catarina com a presença de muitas pessoas, depois a homenagem que a Paróquia Nossa Senhora da Medianeira deu a ele, dando o nome Lucas Mancilha ao auditório da Paróquia. A missa de um ano... e os terços rezados no túmulo...
Sinto muita falta do meu filho, do abraço apertado, de me sentir segura pq ele sempre cuidava de mim, da cumplicidade, de quando olhava e me dizia: deixa pra mim. No hospital ele desmaiou, teve dores fortes de cabeça, ficou com a boca cheia de aftas, vomitou sangue, mas não vi nada disso, ele só falou isso para a irmã, para o pai e a esposa, não me disse, me preservou da dor que sentia, pra mim ele dizia: está tudo bem. Sorria, me amou e cuidou de mim até o último segundo. Por isso fico muito feliz em saber que ele buscou com todas as suas forças a santidade, estava inserido no mundo, mas era um jovem de Deus. E sua Páscoa me fez sentir a mãe mais feliz do mundo, pois vivi com ele tudo que podia, ouvi que me amava muitas vezes. E por sua entrega e fidelidade à Deus, agora está vivendo a vida eterna. Espero que eu consiga seguir o testemunho de vida do meu anjo sorriso, do meu amado filho, para que um dia eu possa também ir para o Céu. Sempre te amarei meu filho.